Festival

De 3 a 12 de outubro de 2025, o festival materiais diversos vai estar em Alcanena e Minde com um programa de dança, performance, música, conversas, caminhadas, atividades para famílias e formação.

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Num ecossistema vivo e em constante mudança do território que habitamos — físico, simbólico, emocional — o festival materiais diversos entra numa edição de transição, entre o que foi, o que é e o que poderá ainda tornar-se. Aqui, o tempo não se desenha em linha reta. Move-se em espiral, ritmado pelos corpos, pelas estações e pela escuta. É um tempo sensível, que pulsa ao ritmo da terra e das pessoas que a habitam.

Esta edição convida-nos a olhar o passado como herança, o presente como prática ativa de cuidado e desejo, e o futuro como um espaço aberto à reinvenção. Há uma atenção renovada ao que deve ser preservado, ao que pode ser reciclado e ao que já não nos serve — sem medo de deixar partir, sem receio de recomeçar.

Esta é a primeira edição sob a minha direção artística, ainda ancorada num programa concebido por Elisabete Paiva, a quem deixo o meu profundo agradecimento. É neste gesto de continuidade e transição que abrimos um novo ciclo — com vontade de radicalizar, suavemente. Cabe-me agora honrar este programa, oferecendo-lhe um novo rosto e um desejo renovado, entrelaçando-o com o projeto mais alargado da Materiais Diversos. Um projeto que reflete sobre os temas que atravessam e moldam a sociedade contemporânea, através de um gesto de presença, desafiando paradigmas políticos e sociais, convocando experiências partilhadas que operam como dispositivos de pensamento e transformação.

Guardamos a herança da proximidade, da escuta atenta ao território, das parcerias fundadas no afeto e na resistência. Preservamos a alegria da celebração comunitária, a força de uma programação comprometida, a radicalidade descentralizadora e os discursos que interrogam o agora — conectando artistas e públicos num espaço de acolhimento e ressonância. Há uma intenção clara de ocupar o corpo como território político e agregador — fundamento das práticas contemporâneas de dança — para aceder ao coletivo, à sua potência transformadora e à força unificadora.

Tomar posição é o eixo central do meu projeto artístico: situar o festival nos contextos local e nacional, ao mesmo tempo que se afirma a sua missão numa perspectiva internacional, conectando práticas e imaginários, modos de fazer e modos de existir. Combinando sustentabilidade e adaptabilidade, o festival materiais diversos é um organismo vivo, inclusivo e dinâmico, capaz de enfrentar os desafios do presente com uma comunidade vibrante, motivada por momentos essenciais de convivência, pensamento e ação.

Transformamos a ideia de programação de uma linha reta numa constelação. Criamos espaço para o invisível, o inacabado, o em progresso. Este festival cultiva espaço para o que ainda não tem nome. Aqui coexistem camadas, tensões e afetos. Alimenta a imaginação radical de um festival sem um único centro — porque tem muitos!

Apesar de todas as incertezas que enfrentamos, estamos aqui! Venham, conversem, pensem. Imaginem o futuro connosco.

Cristina Planas Leitão
Diretora Artística,
Materiais Diversos

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2025
2023
2021
2019
2017

Residências Artísticas
28 Setembro 2020 – 10 Outubro 2020
Estúdios Victor Córdon

Traceology

O termo “traceology” vem das palavras trace (trahere) e ciência ou discurso (-logia) e, portanto, designa o ‘discurso’ ou ‘ciência dos traços’. O termo “traceologia” designa um método científico usado na arqueologia, mais especificamente na arqueologia pré-histórica. O objetivo é determinar a função de uma ferramenta antiga, estudando os vestígios deixados nela, observar o polimento e o desgaste, mesmo em escala microscópica. Como tal, esses rastros oferecem pistas; como a ferramenta foi usada e sua função, como foi manuseada, o movimento que gerou e a matéria que pretendia alterar.
Este novo projeto, Traceology, faz parte da minha pesquisa sobre movimento e da exploração de subtextos como possíveis motores para a ação física, assim como meu estudo da dinâmica e dos estados do corpo. Desta vez, porém, o trabalho é visualizado em um contexto social de realidade (pós-) pandêmica em que nossa relação com os outros foi “amputada” no que diz respeito ao sentido de “toque”, um toque que, apesar de tudo, continua sendo fundamental ao trabalho físico.
O que me interessa na ciência da “traceologia” é como ela, em última análise, depende do estudo de uma série, uma sequência de ‘contatos’ e, portanto, de ‘toques’; o contato entre mão e objeto, objeto e matéria e, conseqüentemente, a mão cuja ação transforma a matéria. Uma ciência dos traços ou, como este projeto o vê, um discurso de gestos – aqui o interesse está em todas as variações possíveis de nuances ao executar o mesmo gesto ou uma multiplicidade de gestos, ao mesmo tempo em que sondando o grau de intensidade dramática na resultante dança.
Trabalhando por meio de explorações, abordaremos os vestígios dos gestos como signos de desaparecimento a serem incorporados, mas também como vestígios que recolheremos, classificaremos ou citaremos ao nos aprofundarmos nas marcas materiais que vemos permanecer.
Como se toca um gesto ou ação?
Como se pode ativar o traço de um gesto ou movimento?
Como acompanhamos o surgimento da ação?
Como podemos tocar um movimento interno?
Como se desliza de um gesto para outro outro, movido pelas imagens carregadas, evocadas, evocadas em cada um de nós?
Como podemos criar uma partitura em que as memórias de infinitos toques passados ​​se tornem passagens que habitamos plenamente, no momento presente?
Olga de Soto, 2020

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